domingo, 23 de maio de 2010

Porque é que se desenvolvem reacções de Stress Pós Traumático?

É importante perceber que a Perturbação de Stress Pós Traumático está muitas vezes associada a uma experiencia avassaladora, ou a uma série de eventos que são difíceis de compreender. Isto é, são experiências que não se encaixam na nossa visão de nós próprios ou do mundo, da maneira como as coisas são ou deveriam ser.
Os seres humanos têm uma tendência natural para tentarem dar sentido aos acontecimentos que acontecem à sua volta. Quando as pessoas experienciam um trauma, o evento está constantemente a voltar-lhes à cabeça, numa tentativa de que consigam dar sentido ao problema, de tentarem perceber o que aconteceu e como aconteceu. Isto é uma forma natural de tentar lidar, ou de se confrontar com a difícil experiência que deu origem ao trauma. Esta forma parece funcionar bem em diversas situações de vida stressantes, no entanto, devido aos altos níveis de stress associados às memórias dos traumas, os pensamentos e sentimentos tendem a ser afastados para proteger as pessoas do stress. O resultado é que enquanto a memória desaparece por um período de tempo, a necessidade de lidar com o acontecimento não foi resolvida e por isso, continua constantemente a voltar à mente do indivíduo. Esta situação de tentar esquecer mas estar constantemente a lembrar os pensamentos intrusivos e os sentimentos consequentes do trauma, pode continuar indefinidamente, a menos que se parta o ciclo de alguma forma. Durante este ciclo de alternativas memórias dolorosas e períodos de evitamento e esquecimento, a sensação de estar preso persiste. A pessoa traumatizada esteve perante um acontecimento que potencialmente pôs em risco a sua vida, ou a vida de outra pessoa, por isso o seu corpo e a sua mente ficam em alerta para ter a certeza de que não perderão qualquer sinal no caso de tal evento voltar a acontecer. É mais seguro errar por dar demasiada importância a uma potencial ameaça do que falhar em perceber uma ameaça futura. No entanto, esta constante activação deste sistema de detecção de ameaças, leva a pessoa traumatizada se sinta ainda mais presa e à beira do precipício na maior parte do tempo. Adicionalmente, este sistema de detenção de ameaças é tão sensível que está constantemente a ser activado, mesmo em situações em que não existe perigo, de uma maneira que interfere com a capacidade do indivíduo de viver uma vida feliz e normal.
Uma explicação similar existe no que diz respeito à raiva. A raiva era uma emoção/reacção útil em batalha ou noutras situações, pois acelera o indivíduo e instiga a sua sobrevivência. Desta forma, pode muitas vezes ser uma maneira de responder a situações de ameaça de vida e é certamente melhor do que ficar imobilizado com medo. No entanto, e mais uma vez, não é mais útil para a sobrevivência do indivíduo depois de o perigo ter passado. De facto, como todos sabemos, começa a causar sérios problemas na nossa vida do dia-a-dia. As reacções derivadas da Perturbação de Stress Pós Traumático são por isso, sensíveis e adaptativas, tanto na parte de sobreviver na situação que deu origem ao trauma, e na tentativa de por um fim no trauma em si.
Assim que o indivíduo reconheça de onde vêm estes sintomas, é mais fácil compreender as reacções que tem. A parte difícil é desligar-se destas reacções que já deixaram de ser proveitosas e interferem significativamente com a qualidade de vida das pessoas.

Estudos Realizados

O quadro sintomatológico característico do PTSD surge logo após um acontecimento traumatizante, embora possa decorrer um período de latência de alguns meses ou até mesmo anos até se manifestar. É frequente nos indivíduos com PTSD, uma forte labilidade emocional e sentimentos de depressão, os quais podem conduzir a comportamentos auto-destrutivos e abuso de substâncias como o álcool ou drogas. Assim, é frequente em muitos ex-combatentes da guerra colonial portuguesa, estarem associados ao PTSD, sintomas de depressão, ansiedade e de psicopatologia em geral (Albuquerque, 1992).

É de igual modo importante salientar que em muitos casos, mesmo que ocorra um acontecimento de natureza traumática, nem todas as pessoas que o vivenciaram manifestam sintomas desta Perturbação. Deste modo, parece que o acontecimento traumático, é condição necessária mas não suficiente para o desencadeamento de PTSD. Assim, os estudos realizados têm sido controversos e como tal sugerem que para além do acontecimento traumático, os factores da personalidade, genéticos, físicos, psicológicos e as estratégias de coping utilizadas, podem contribuir para o aparecimento do PTSD. Para além de todos estes factores, é também de grande relevância o tipo de rede de suporte social do sujeito, que poderá ou não contribuir para a minimização dos efeitos do PTSD.

Muitos têm sido os trabalhos realizados sobre o PTSD, que vão desde a etiologia ao fenómeno da patologia, passando pelas diferentes intervenções terapêuticas. A nível internacional a maior parte das investigações realizadas, enquadram-se se naquelas que resultam dos acontecimentos causados deliberadamente pelo homem, nomeadamente as guerras, e Portugal não é excepção.

Assim, contamos no nosso País com a presença de alguns trabalhos realizados sobre esta temática, onde uma grande parte deles se desenvolveram através da equipa do Dr. Afonso de Albuquerque no Serviço de Psicoterapia Comportamental do Hospital Júlio de Matos. Estes trabalhos têm então incidido em aspectos particularmente importantes, como o diagnóstico e a psicoterapia em ex-combatentes de Guerra. Segundo Albuquerque (1992), a guerra colonial, que decorreu entre 1961 e 1974, envolveu cerca de um milhão de homens dos quais 10000 foram mortos e cerca de 30000 ficaram feridos. Segundo ele, comparando estes dados com os da Guerra do Vietname, poderão existir cerca de 140000 ex-combatentes portugueses com problemas psicológicos e desses, cerca de 30% com PTSD. O autor acrescenta ainda que devemos também ter em conta, o número de pessoas que vivem com os ex-combatentes e que possam estar, também elas perturbadas.

Num estudo do “Center for Disease Control”, referente à Guerra do Vietname, foi concluído que 26% dos Veteranos, eram portadores de sintomas psicopatológicos, e que 7% deles, sofriam de Perturbação Depressiva Major. De igual modo, 27% dos prisioneiros de guerra, possuíam doenças psiquiátricas graves. Deste modo, as estimativas sugeriram que cerca de 15% dos veteranos do Vietname, sofriam de PTSD.

Para além de ser visível na maior parte dos estudos a correlação existente entre sujeitos com PTSD e a violência, começam a emergir diferentes variáveis associadas, como o caso do abuso de substâncias tóxicas e os problemas inter-pessoais. Um exemplo onde podemos observar isto, é o estudo realizado por Yager, no qual 16% dos Veteranos, admitiram ter problemas no emprego e com os amigos, devido ao álcool, sendo que alguns deles, tinham sido detidos pela polícia pelo menos uma vez.

domingo, 25 de abril de 2010

Critérios de Diagnostico (DSM - IV - TR)

A. A pessoa foi exposta a um acontecimento traumático em que ambas as condições seguintes estiveram presentes:
1) A pessoa experimentou, observou ou foi confrontada com um acontecimento ou acontecimentos que envolveram ameaça de morte, morte real ou ferimento grave, ou ameaça à integridade física do próprio ou de outros;
2) A resposta da pessoa envolve medo intenso, sentimento de desprotecção ou horror. Nota: em crianças isto pode ser expresso por k agitado ou desorganizado.

B. O acontecimento traumático é reexperienciado de modo persistente de 1 (ou mais) dos seguintes modos:
1) Lembranças perturbadoras intrusivas e recorrentes do acontecimento que incluem imagens, pensamentos ou percepções. Nota: em crianças muito novas podem ocorrer brincadeiras repetidas em que os temas ou aspectos do acontecimento traumático são expressos:
2) Sonhos perturbadores recorrentes acerca do acontecimento. Nota: em crianças podem existir sonhos assustadores sem conteúdo reconhecível;
3) Actuar ou sentir como se o acontecimento traumático estivesse a reocorrer (inclui a sensação de estar a reviver a experiência, ilusões, alucinações e episódios de flashback dissociativos, incluindo os que ocorrem ao acordar ou quando intoxicado). Nota: em crianças podem ocorrer representações de papéis específicos do acontecimento traumático;
4) Mal-estar psicológico intenso com a exposição a estímulos internos ou externos que simbolizem ou se assemelhem a aspectos do acontecimento traumático;
5) Reactividade fisiológica durante a exposição a estímulos internos e externos que simbolizem ou se assemelhem a aspectos do acontecimento traumático.

C. Evitamento persistente dos estímulos associados com o trauma e embotamento da reactividade geral (ausente antes do trauma), indicada por 3 (ou mais) dos seguintes itens:
1) Esforço para evitar pensamentos, sentimentos ou conversas associados com o trauma;
2) Esforços para evitar actividades, lugares ou pessoas que desencadeiam lembranças do trauma;
3) Incapacidade para lembrar aspectos importantes do trauma;
4) Interesse ou participação em actividades significativas fortemente diminuídos;
5) Sentir-se desligado ou estranho em relação aos outros;
6) Gama de afectos restringida (ex: incapaz de gostar dos outros);
7) Expectativas encurtadas em relação ao futuro (ex: não esperar ter uma carreira, casar, ter filhos ou um desenvolvimento normal de vida).

D. Sintomas persistentes de aumento da activação (ausentes antes do trauma), indicados por 2 (ou mais) dos seguintes itens:
1) Dificuldade em adormecer ou em permanecer a dormir;
2) Irritabilidade ou acessos de cólera;
3) Dificuldade de concentração;
4) Hipervigilância;
5) Resposta de alarme exagerada;

E. Duração da perturbação (sintomas dos Critérios B, C e D) superior a 1 mês.

F. A perturbação causa mal-estar clinicamente significativo ou deficiência no funcionamento social, ocupacional ou qualquer outra área importante.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Para muitos veteranos de guerra, a guerra nunca acaba…


O Stress Pós-Traumático é uma forma de ansiedade, que se segue à experiência de um acontecimento particularmente traumático sobre o plano psicológico. A experiência traumatizante é exterior ao indivíduo, fora dos acontecimentos comuns da vida humana, como sejam as situações de guerra, tortura, abuso sexual, catástrofes naturais, desastres provocados pelo homem, situações onde a maioria das pessoas não tem capacidade de desenvolver as reacções mas adequadas. Imagens, pesadelos, sensações corporais inexplicáveis, mantêm a vivência de um mal-estar incontrolável e muitas vezes quase insuportável. Para além desta “revivência” contínua, as sensações de embotamento emocional, dificuldades de concentração, instabilidade e dificuldades de controlo de impulsos tornam difícil a construção de uma vida pessoal, familiar e social alternativa. Esta situação pode tornar-se numa doença psiquiátrica crónica, marcada por surtos e remissões. As investigações clínicas apontam para a ocorrência de alterações neurobiológicas do Sistema Nervoso central e periférico nestes casos.